4h45, manhãzinha. Manhãzinha ainda: ela vai aparecendo agora, crescendo. Um grilo lá; um relógio aqui. A rebarba do sono fica no travesseiro; o zumbido do relógio, convocando para o dia, passa o facão no sono tegumentado à cama. "Que pensamento longo, Jesus". "Que vida curta, meu Deus". "Que dia torto, Senhor". E a santidade responde por todos os nomes, clamada quando o sono acaba e a vida tem um novo recomeço. Mas é manhãzinha ainda. E, cedo, chama a fé.
Quer barulho, quer vidinhas, quer murmurinhos ainda na cama, antes do café. Cheira o ar com cheiro de coador de café, cheiro de vô no quintal com rapé, cheiro de vó na cozinha com panela. É o cheiro de amor, é o cheiro dela.
Antes de pôr o pé pra fora da cama, lembra de quem ama, lembra de quem quer. O estrado estrala.
"Volta pra cama, amor".
"Num volto, quero café".
"Volta amor, descansa... Te acordo mais tarde num chêro e num cafuné".
"Volto. Pelo chêro, por ser o que é. Cê sabe que te gosto e gosto do teu café".
"Pois é, Zé, pois é... Vida onça, cabriola, te amo, rapaz, mas não sei como é que é".
"Nem sei eu como é o que você diz que não sabe como é que é. Só sei que é. É assim esse gostar de paixão que me rodeia".
"Mas é muita paixão, Zé. Perde-se nas contas... Mas o meu coração está muito bem achado, sabe muito bem o que quer: te quer".
"Senhora minha, amor de juventude, boa de saúde e boa do pé, quero brindar esse amor com um gole do teu café".
"Paixão devora a alma e a calma; a paciência e a ciência; a mim e a ti".
"Não é só paixão ligêra e fugaz, é amor, e amor engole o tempo".
"E o tempo é quem faz nascer o amor".
"Pois é. Amor senti".
"Pois é. Amor sem ti não há."