Na noite friazinha, protegia-me com meu blazer e com minha leitura. Recostado ao ponto de ônibus, esperava pelo coletivo que me levaria à minha residência.
Fornia-me pouca sensação de proteção esperar pelo ônibus ali, enquanto lufadinhas frias miravam meu pescoço desprotegido.
Aos poucos, no ponto de ônibus onde só havia eu, começam aproximar-se outras pessoas, cada qual na espera de seu coletivo.
O volume que eu tinha em mãos era A Montanha Mágica, de Thomas Mann, com suas mais de 950 páginas.
Dois rapazes, logo ao meu lado, que papeavam já antes da chegada ao ponto, parece que desenrolavam um papo alegre, típico de véspera de feriado, de quem não precisará acordar cedo no dia seguinte para aqueles desesperos, velados, da cidade grande.
Embora concentrado na leitura, ouvi um deles fazer o comentário:
- Isso é que é gostar de ler.
O outro contra-argumentou:
- É, tem que ler mesmo. Quem não gosta de ler dança...
O do primeiro comentário emendou:
- É mesmo. Mas eu não tenho paciência. Toda vez que pego um livro me dá sono.
O "Isso é que é gostar de ler" era claramente referência a mim, que segurava um volume reconhecidamente grande.
Quando tentei destinar comandos de mais atenção aos ouvidos, para ouvir melhor aquele diálogo, a pouco mais de um metro de onde eu estava, não houve tempo.
Foi o tempo de o letreiro amarelo iluminado despontar lá na esquina e eu perceber que o meu ônibus já chegava, sinalizando iluminando o que era o meu destino.
Entrei. Percebi que os dois rapazes entraram no mesmo ônibus. Continuavam a conversa, alegres e exultantes, mas já falavam sobre outras coisas, que não consegui me ater ou distinguir.
Passei a catraca. Me dirigi ao fundo do ônibus, onde escolhi um lugar ao lado da janela. Ajeitei-me com a mochila, que naquela noite estava quase vazia.
Os dois rapazes sentaram-se mais atrás, a dois bancos do meu.
Conscientemente, naquela noite, a mochila estava carregada de poucos apetrechos. O único livro que eu carregava estava em minhas mãos.
Depois de ajeitar-me, abri o livro e voltei à leitura, brevemente interrompida quando uma menina sentou-se no lugar que sobrara ao meu lado.
Para a minha surpresa, três minutos depois que eu já me concentrara novamente na leitura, um dos rapazes levantou-se e dirigiu-se até mim.
Chegando ao banco onde eu estava, ele estendeu a mão pra mim.
Num instante muito breve, mesmo, pensei que ele queria me cumprimentar, sem saber a razão. Antes, ele me despertou das páginas:
- Moço, tó pra você. É um marcador de páginas lá da onde eu trabalho. Acho que vai ser bom pra você e para o seu livro.
Olhei pra ele. Eu sentado, ele em pé. Me estendendo sua mão com um pequeno marcador de páginas de metal, dourado.
Eu agradeci o gesto e fiquei, ainda um pouco inerte, sem graça. Agradeci novamente. Fiquei por uns bons instantes olhando para aquele marcador.
Era realmente bonito o marcador, mas também o gesto do rapaz. O marcador era retangular, de proximadamente 5x3 cm.
No marcador havia o logo de uma empresa de engenharia, possivelmente onde o rapaz trabalhava.
Parei um pouco pra pensar. Voltei-me para o livro.
Tudo muito simples. Um instante para marcar a noite, os dias.
Um bonito marcador de página, que não só marca páginas.
Mas vamos marcar a página...
Fornia-me pouca sensação de proteção esperar pelo ônibus ali, enquanto lufadinhas frias miravam meu pescoço desprotegido.
Aos poucos, no ponto de ônibus onde só havia eu, começam aproximar-se outras pessoas, cada qual na espera de seu coletivo.
O volume que eu tinha em mãos era A Montanha Mágica, de Thomas Mann, com suas mais de 950 páginas.
Dois rapazes, logo ao meu lado, que papeavam já antes da chegada ao ponto, parece que desenrolavam um papo alegre, típico de véspera de feriado, de quem não precisará acordar cedo no dia seguinte para aqueles desesperos, velados, da cidade grande.
Embora concentrado na leitura, ouvi um deles fazer o comentário:
- Isso é que é gostar de ler.
O outro contra-argumentou:
- É, tem que ler mesmo. Quem não gosta de ler dança...
O do primeiro comentário emendou:
- É mesmo. Mas eu não tenho paciência. Toda vez que pego um livro me dá sono.
O "Isso é que é gostar de ler" era claramente referência a mim, que segurava um volume reconhecidamente grande.
Quando tentei destinar comandos de mais atenção aos ouvidos, para ouvir melhor aquele diálogo, a pouco mais de um metro de onde eu estava, não houve tempo.
Foi o tempo de o letreiro amarelo iluminado despontar lá na esquina e eu perceber que o meu ônibus já chegava, sinalizando iluminando o que era o meu destino.
Entrei. Percebi que os dois rapazes entraram no mesmo ônibus. Continuavam a conversa, alegres e exultantes, mas já falavam sobre outras coisas, que não consegui me ater ou distinguir.
Passei a catraca. Me dirigi ao fundo do ônibus, onde escolhi um lugar ao lado da janela. Ajeitei-me com a mochila, que naquela noite estava quase vazia.
Os dois rapazes sentaram-se mais atrás, a dois bancos do meu.
Conscientemente, naquela noite, a mochila estava carregada de poucos apetrechos. O único livro que eu carregava estava em minhas mãos.
Depois de ajeitar-me, abri o livro e voltei à leitura, brevemente interrompida quando uma menina sentou-se no lugar que sobrara ao meu lado.
Para a minha surpresa, três minutos depois que eu já me concentrara novamente na leitura, um dos rapazes levantou-se e dirigiu-se até mim.
Chegando ao banco onde eu estava, ele estendeu a mão pra mim.
Num instante muito breve, mesmo, pensei que ele queria me cumprimentar, sem saber a razão. Antes, ele me despertou das páginas:
- Moço, tó pra você. É um marcador de páginas lá da onde eu trabalho. Acho que vai ser bom pra você e para o seu livro.
Olhei pra ele. Eu sentado, ele em pé. Me estendendo sua mão com um pequeno marcador de páginas de metal, dourado.
Eu agradeci o gesto e fiquei, ainda um pouco inerte, sem graça. Agradeci novamente. Fiquei por uns bons instantes olhando para aquele marcador.
Era realmente bonito o marcador, mas também o gesto do rapaz. O marcador era retangular, de proximadamente 5x3 cm.
No marcador havia o logo de uma empresa de engenharia, possivelmente onde o rapaz trabalhava.
Parei um pouco pra pensar. Voltei-me para o livro.
Tudo muito simples. Um instante para marcar a noite, os dias.
Um bonito marcador de página, que não só marca páginas.
Mas vamos marcar a página...
3 comentários:
Pequenos e bonitos gestos que hoje em dia a gente demora para acreditar...
Tocante, surpreendente.
As cidades, as pessoas tem dessas; e como eu gosto disso!
E, além de tudo, marcou para sempre o *ler* da Montanha -imagino.
(e o mais in-crível, é que há pessoas que não estão entre as outras, que não circulam pelas ruas e pelos coletivos; pessoas próximas a mim, vejo... e como perdem, não?)
Singelo e cheio de significados... momentos simples que ramificam e engendram complexidades...
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